O desafio do ensino médio

 

Carlos Henrique Araújo e Nildo Luzio (*)


A demanda pelo ensino médio vem crescendo fortemente. Hoje,são cerca de 9 milhões de estudantes no ensino regular. Nesse sentido, o desafio nacional é incorporar mais estudantes,com o melhor aprendizado. E qual é a situação hoje? Ela pode ser evidenciada nos indicadores produzidos pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica. (Saeb).

Os dados indicam que 42% dos alunos do terceiro ano do ensino médio estão nos estágios “muito crítico “ e “critico” de desenvolvimento de habilidades e competências em Língua Portuguesa. São estudantes com dificuldades em leitura e interpretação de textos de gêneros variados.Não são leitores competentes e estão muito aquém do esperado para o final do ensino médio.

Os denominados “adequados“ somam 5%. São os que demonstram habilidades de leitura de textos argumentativos em textos longos, estabelecem relação de causa e conseqüência, identificam efeitos de ironia ou humor em textos variados, efeitos de sentidos decorrentes do uso de uma palavra, expressão e da pontuação, além de reconhecerem marcas lingüísticas do código de um grupo social.

Entre 1995 e 2001,a média nacional de desempenho em língua Portuguesa apresentou quedas constantes, caindo 10% em todo o período. No primeiro ano referido, as cinco regiões brasileiras estavam no estágio  “Intermediário”, segundo as leituras das médias dos estudantes no último ano pesquisado, Norte e Nordeste caem para o estágio “crítico”, justamente as regiões mais pobres do país. As demais, que estavam próximas do estágio adequado, em 1995, agora ficaram próxima do estágio “crítico”.

Ressalta-se que, hoje, nenhum Estado brasileiro média de desempenho  “adequada”; 17 encontram-se no estágio “intermediário” e 10 estão no “crítico”.

A escala de desempenho do Saeb é única para cada disciplina investigada, descrevendo as habilidades e competências desenvolvidas pelos estudantes na quarta e na oitava séries do ensino fundamental e no terceiro ano do ensino médio.

É possível fazer comparações entre as séries, isto é, avaliar quanto os estudantes agregaram de conhecimento nos três anos de ensino médio. Cerca de 74% dos alunos apenas consolidaram níveis de habilidades e competências, em leitura,considerados adequados entre a quarta e a sétima séries do ensino fundamental e 21% adquiram somente as habilidades características da oitava série. Os  números evidenciam que pouco conhecimento foi adicionado após três anos de ensino médio, desnudando a falta de eficiência desse nível.

Algumas características dos alunos brasileiros ajudam a entender o problema. Os estudantes de desempenho “muito crítico”, em sua maioria, 76%, estão matriculados no ensino noturno, 96% em escolas públicas, 48% conciliam trabalho e estudo e 84% têm idade acima da considerada ideal para a série. São filhos de mães com baixa escolaridade.

O perfil dos estudantes com desempenho “ adequado” é quase o oposto. A maioria, 76%, estuda na rede privada de ensino, 89% freqüentam aulas no período diurno, 87% somente estudam e 84% não apresentam distorção idade-série. São filhos de mães de maior escolaridade,80% delas têm no mínimo o ensino médio. O ensino é mais ineficaz justamente para os estudantes mais carentes.

Além dos dados de baixa qualidade e desigualdade, temos hoje cerca de 1 milhão de estudantes da rede pública abandonando o ano letivo, correspondendo a cerca de 17% dos matriculados; 70% dos que abandonam o ensino médio estão matriculados no noturno.

No Brasil, hoje, temos um enorme contingente de estudantes concluintes do ensino médio sem preparo para o trabalho, sem condições concretas competente no ensino superior e um enorme desperdício de recursos públicos com a evasão e o abandono.

Os dados sugerem reformulações estruturais para o ensino médio. É preciso repensar o conteúdo do que é ensinado, melhorar a capacitação dos professores, valorizando-os como profissionais de fato, além de melhorar o fluxo. Isso não deverá ser feito de forma atabalhoada. São muitas as variáveis a serem consideradas. O que se sabe é que a demanda por vagas é crescente, há falta de professores, principalmente para algumas disciplinas, e as desigualdades são patentes. As soluções para esse nível de ensino serão estratégicas para melhorar a qualidade da formação profissional dos jovens brasileiros e ampliar o número de alunos mais bem qualificados no ensino superior. Esse é um problema da nação e de todos os entes federados.


(*) Diretor de Avaliação da Educação básica e presidente substituto do Inep/MEC;  Coordenador da Diretoria de Avaliação da Educação Básica do Inep/MEC
(in Jornal do Brasil, 03/01/04)

 


Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação

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