Publicação do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação
ano 2
5 - nº 1
21 - novembro/dezembro de 2007
ISSN 0130-071X

Editorial

 

A última edição de 2007 da revista Atualidades em Educação permite uma abordagem sob diversos focos da educação brasileira.
Destacam-se vários estudos retratados em artigos de especialistas nacionais, cujos nomes são extremamente conhecidos e em muito ainda são lembrados quando se promovem encontros para reflexões e aprofundamentos.
Aliás o ano foi coroado com múltiplos congressos, seminários, simpósios e outros tipos de eventos espalhados por várias cidades brasileiras.  Muito se discutiu e as conclusões marcaram fortes tendências por pressões  por mudanças.
Alguns ecos ressoaram e fizeram com que o governo federal viesse a baixar um plano de desenvolvimento da educação com vários programas que podem, se forem efetivamente cumpridos, melhorar as perspectivas dos estudantes em todo o país.


João Roberto Moreira Alves
                                                     
Presidente do Instituto de Pesquisas
                                                      Avançadas em Educação

 (IPAE -191-11/07)

Desenvolvimento da educação


Dalmo Dallari(*)


A educação é necessidade essencial da pessoa humana e por isso mesmo foi inserida com grande ênfase na Constituição brasileira de 1988, como direito de todos e dever do Estado. Apesar da importância óbvia da educação para as pessoas, individualmente consideradas, e para a convivência humana, e não obstante a existência de normas internacionais e constitucionais de caráter impositivo, enfatizando-a como direito de todos, ela não tem sido tratada como prioridade no Brasil por muitos governos, tanto no plano federal quanto no estadual e municipal. Na realidade, pode-se afirmar que nas regiões mais atrasadas do país, onde ainda é muito forte o predomínio de grupos oligárquicos, o descaso pela educação é intencional, pois faz parte do sistema de dominação.
Nos últimos tempos, tem sido dado grande relevo a informações sobre deficiências graves do sistema educacional, tanto no âmbito público quanto no privado, e sobre distorções altamente maléficas na exploração econômica do setor da educação, apontando-se também as deficiências do ensino profissional, que não está ajustado às necessidades e possibilidades da realidade brasileira de hoje. Quanto ao ensino básico, além da falta de escolas em muitas regiões, verificou-se que existem muitas escolas com instalações precárias e sem o equipamento indispensável. Isso agravado pelo desempenho insatisfatório de professores, ou por desinteresse ou por suas freqüentes ausências, sob a justificativa de problemas de saúde. E hoje se sabe que em muitos casos o desinteresse e as ausências são motivados pelo baixo nível de remuneração, que além do desestímulo ao maior empenho gera também a necessidade de buscar um complemento para ter um nível de vida decente.
Quanto ao ensino superior, o que mais tem aparecido na imprensa é a comprovação do baixíssimo nível de grande número de faculdades de direito, que mediante pagamento fornecem um diploma de bacharel que está muito longe de representar a aquisição de conhecimentos. E muitos estudantes só percebem isso quando não conseguem aprovação no exame de Ordem, que lhes daria o direito de exercer a advocacia. Ainda bem recentemente foi noticiada a ocorrência de situação semelhante na área da medicina, sendo muito grande o número de médicos que concluíram o curso sem ter feito residência, sem ter recebido, portanto, a necessária complementação, na prática e em ambiente hospitalar, do ensino teórico ministrado nas faculdades.
O dado positivo, que deve merecer muita atenção, inclusive da imprensa, é o esforço que vem sendo feito pelo ministro da Educação, Fernando Haddad, para correção das falhas mais graves, por meio de um amplo programa de ação, denominado Plano de Desenvolvimento da Educação. Na apresentação do Plano, explica o ministro, que se trata, na realidade, de um conjunto de políticas públicas, organizadas em torno de quatro eixos norteadores: educação básica, que vai da creche ao ensino médio; educação superior; educação profissional e alfabetização.
Nesse Plano foram estabelecidos instrumentos de integração dos diferentes níveis de ensino, como também a conjugação de esforços e responsabilidades dos municípios, dos Estados e da União, prevendo-se ainda os meios de ação conjunta dos setores público e privado.
O desafio é muito grande, pois além do obstáculo de vícios muito antigos e arraigados, há também a incompreensão e resistência de governos que não querem assumir os ônus da educação, porque essa área rende muito pouco em termos de favorecimento dos objetivos pessoais, grupais ou partidários. É importante procurar conhecer melhor o Plano de Desenvolvimento da Educação e dar-lhe decidido apoio, pois os resultados, além de significarem a efetivação do respeito à dignidade humana, serão direta e altamente benéficos para todo o povo brasileiro.

(*)Professor e jornalista, in Jornal do Brasil

(IPAE -192-11/07)

Bom salário faz diferença

Jorge Werthien(*)


Por que os professores deveriam ganhar mais? Eis uma pergunta que não quer calar. Nem deve. No Brasil, assim como na América Latina em geral, sucessivos governos - nos níveis municipal, estadual e federal - enfrentam reivindicações, protestos e greves de professores por melhores salários e condições de trabalho. Nenhum governo escapa, tenha a coloração política que tiver. Nenhum deles nega o problema. Parece haver consenso entre eles sobre a insuficiência do salário dos professores. O mesmo não ocorre no seio da sociedade, onde surgem argumentos como o de que o salário dos docentes tem pouco ou nenhum impacto sobre a qualidade da educação. Afinal, por que os professores não deveriam ganhar mais?
O discurso oficial em todas as esferas da administração pública estabelece a educação como prioridade. Prefeitos, governadores e presidentes da República têm reservado lugar de honra à educação em suas plataformas políticas. O salário dos professores, porém, ainda não condiz com essa posição, sobretudo nos âmbitos municipal e estadual, onde se encontra a maioria do corpo docente brasileiro, responsável pelo ensino fundamental e médio. A adoção do Fundeb repara parte do problema, mas ainda não o soluciona.
A pesquisa "O perfil dos professores brasileiros", de 2004, revela que 65,5% dos professores têm renda familiar entre dois e dez salários mínimos, e que 36,6% ficam na faixa entre cinco e dez salários mínimos. O estudo destaca que aproximadamente um terço dos docentes se classifica como pobre. A maioria deles se considera pertencente à classe média baixa. A origem deles tampouco é melhor, em termos econômicos.
A mesma pesquisa revela que 67,6% dos professores têm curso superior, enquanto 32,3% deles têm apenas o ensino médio. E salienta: "A formação do professor constitui variável correlacionada com sua renda familiar." Segundo o relatório "Lápis, borracha e teclado", lançado recentemente pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla), pouco mais da metade dos professores brasileiros (54,1%) manifestou ter utilizado a internet nos três meses anteriores à data da pesquisa (no caso, a PNAD 2005). Mas esse índice varia muito segundo a região. Mal chega a 35% no Norte e no Nordeste, por exemplo.
Como exigir educação de qualidade para todos, quando os responsáveis por ministrá-la não dispõem de condições suficientes para se graduar em universidades de primeiro nível, cursar pós-graduação, viajar, ter acesso às novas tecnologias e à internet, assinar jornais e revistas, aprender idiomas? Sem salário digno e competitivo em relação a outras ocupações, como os professores podem se sentir cidadãos de maneira a formar outros cidadãos para o mundo contemporâneo? Sem salário digno, similar a outras categorias profissionais mais bem remuneradas, como conseguir incorporar ao magistério os melhores alunos do ensino médio e da graduação? Ter a educação como prioridade deve implicar ter os professores como prioridade.
Sabe-se que o problema é complexo, e a docência é hoje uma profissão de massas. Aumentar o salário dos docentes na proporção que os desafios atuais exigem teria grande impacto nos orçamentos federal, estadual e municipal. Mas é indispensável avançar gradualmente, acompanhando o aumento salarial com avanços na profissionalização, formação, reciclagem e responsabilidade pelos resultados. Professores bem remunerados podem não significar necessariamente uma melhora do ensino em curto prazo, mas certamente em médio e longo prazos a presença de professores bem pagos fará diferença nas salas de aula.

   (*)Diretor executivo da Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla), in O Globo

(IPAE -193-11/07)

Prioridade à educação

Jorge Maranhão(*)


Acerca de sua pesquisa sobre "A cabeça do brasileiro", o sociólogo Alberto Carlos de Almeida declarou à revista "Veja" que a maioria dos brasileiros tem uma visão mais arcaica da sociedade porque tem baixa escolaridade e, por conseguinte, na medida em que a educação se universalize, a visão mais moderna se tornará majoritária. Daí podemos concluir que, enquanto não assumirmos a missão histórica de uma verdadeira elite, que entenda e assimile a importância estratégica da educação para superarmos nossas mazelas, e decida participar efetivamente da vida pública para garantir esta conquista, o Brasil não terá jeito!
Permanecemos no círculo vicioso de não termos uma educação de qualidade porque não temos uma elite participando da vida política. E não temos uma elite participando da vida política do país porque não temos educação política suficiente para discernir entre opinião pública e interesse público, até mesmo pela dissuasão cotidiana da mídia de que a política é o domínio da delinqüência social e não propriamente lugar dos homens de bem.
Quando, na ordem democrática, "sujar" as mãos com a política é o único jeito de se impedir a má aplicação do dinheiro público, sobretudo no campo sagrado da educação pública de qualidade, universal e laica. Se a participação política é dever de cada cidadão brasileiro e a essência da verdadeira cidadania, a má aplicação dos recursos públicos em qualquer campo da ação do Estado não é tão nefasta quanto na educação básica.
Se estamos nos dando conta de que não pode haver corrupção na aplicação dos recursos públicos, no caso da educação especificamente, temos de ser intolerantes! O que é mais uma tarefa da mídia do que propriamente da educação. Pois não precisamos ser necessariamente uma elite bem formada para nos convencermos da prioridade estratégica da educação.
A educação não é apenas um sistema de transmissão de conhecimento, assim como a justiça não produz apenas conduta, a política, normas, e a mídia, informação. Para além disso, todos produzem valores! Principalmente os valores clássicos do legado humanista: a vida, a legalidade, a liberdade e a propriedade. Todos estes sistemas são responsáveis pela formação cívica e política do cidadão e, quando um falha ou se mostra insuficiente na reprodução dos valores da cultura de cidadania, temos de exigir maior desempenho dos demais.
Por isso a educação não pode ser projetada na mídia apenas como dever formal do Estado ou como pretexto para campanhas de marketing de reputação corporativa ou de responsabilidade social empresarial. Políticas públicas de educação de qualidade são resultado de responsabilidade política empresarial e compromisso público rigoroso entre governantes e governados.
Se todos estamos cansados de saber dos problemas brasileiros, agora é chegada a hora de resolvê-los! Para a efetividade da educação e da democracia, temos de extirpar a demagogia de nossa cultura política! Temos de nos engajar numa campanha cívica pelo controle social dos orçamentos da educação.
É chegada a hora de enfrentarmos nossa miséria política e superarmos os impasses da crise de gestão do setor público e da crise de valores do setor privado. Pois não é verdade que o povo brasileiro não presta. Não é verdade que não temos políticos em quem confiar. Não é verdade que somos individualistas e não sabemos agir em coletivo. Se ao menos alguns poucos políticos têm marcado seus mandatos com compromissos claros com a educação pública de qualidade, façamos deles os representantes maiores da cidadania mais ativa e consciente.
Reinventemos o estado democrático a partir de uma nova relação de representação baseada na prestação de contas de todos os mandatos. E usemos a mídia para celebrar, garantir e fiscalizar com firmeza este novo compromisso público. Podemos tolerar falhas e fracassos em qualquer outro campo da ação governamental, mas temos de eleger a educação como a marca inicial de uma revolução em nossos costumes políticos, o espaço de resgate da plena cidadania e o fim do jeitinho e da cultura de impunidade. O grande feito, enfim, de todos os cidadãos e não de um novo salvador-da-pátria, grão-provedor patriarcal, um novo "pai dos pobres" ou demagogo da vez!

       (*)Publicitário e diretor do Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão, in O Globo

(IPAE -194-11/07)

Efeito didático

Ali Kamel(*)

 
Houve de tudo na reação provocada por meus dois artigos sobre livros didáticos. Tão logo saiu minha crítica ao "Nova História Crítica", o MEC se apressou a dizer duas coisas: o livro foi incluído na relação do MEC ao tempo de FH e excluído dela no Governo Lula. Quando publiquei o artigo sobre o Projeto Araribá, acusando-o, entre outras coisas, de fazer propaganda político-eleitoral do PT, o ministro da Educação, Fernando Haddad, disse o seguinte: "O MEC só compra livros escolhidos pelos professores. Então, só tem três soluções: manter a liberdade, censurar os livros ou trocar os professores. Eu fico com a primeira." É, então, o caso de perguntar: a reprovação do "Nova História Crítica" se enquadra em qual das três categorias? Ou seja, retirar o livro que faz propaganda eleitoral do PT é censura; banir o "Nova História Crítica" não é. Um método de avaliação que não comporta uma reavaliação extraordinária é falho.

O curioso é que, antes de escrever o artigo, apurei junto ao MEC se o livro constava da lista dos recomendados e obtive um "sim" como resposta. Não sei por que agiram assim, mas, mesmo que tivessem me informado corretamente, o artigo seria publicado, naturalmente com a explicação do ministério: o fundamental era que o livro ficará em sala de aula até o fim do ano e permaneceu nela durante anos.Disseram também que eu omiti críticas que o autor de "Nova História Crítica" faz ao socialismo real. Também não é verdade. Logo na abertura, eu escrevi que, para o autor, o socialismo só "fracassou até aqui por culpa de burocratas autoritários". Os trechos que reproduzi falam por si. Este é o ponto: o que pretendi mostrar, e mostrei, é que o livro tem o propósito de doutrinar as crianças para que acreditem que o socialismo é a melhor forma de organizar a sociedade, que o capitalismo é mau e que o que existiu até aqui não é o socialismo verdadeiro (embora o autor diga que as experiências socialistas foram melhores do que as das sociedades capitalistas de hoje). Vale reproduzir o trecho que fecha o livro. Depois de descrever o Fórum Econômico Mundial, o livro afirma: "Mas havia gente de fora que queria dizer não. Muita gente. A maioria das pessoas do planeta. Gente que não é proprietária de ações, que não viaja de avião na primeira classe, que não aceita que o mercado e os lucros capitalistas sejam colocados num altar como figuras divinas. Na cidade de Porto Alegre, o século XXI se abriu com duas grandes conferências (2001 e 2002) do Fórum Social Mundial. Percebeu a diferença no nome? O que deve ficar em destaque não é a economia (os lucros das grandes empresas), mas o social (o bem-estar da humanidade). (...) A idéia fundamental era a mesma: organizar a luta mundial contra o domínio absoluto do grande capital. O planeta deve pertencer à humanidade inteira. (...) Será essa a nova forma de fazer política no século XXI? Em vez de um partido político centralizado que se considera dono da verdade, múltiplas associações que se encontram, livres, autônomas, mas com o sentimento de um projeto comum, o de que é possível construir um outro mundo? A resposta, amigo leitor, caberá à sua geração." Mais doutrinação do que isso?Mas meus artigos produziram outras reações bizarras. Dois deputados do PT, Fernando Ferro e Rui Falcão, acusaram-me de estar a favor do capital estrangeiro, ao criticar o livro, de enorme sucesso, editado por uma editora brasileira, a Nova Geração. Meu objetivo escuso seria o de ajudar a espanhola Santillana, dona da Editora Moderna, que, hoje, detém a maior fatia dos livros didáticos comprados pelo MEC. A infelicidade dos deputados é que Ferro fez o seu discurso exatamente no mesmo dia em que O GLOBO publicou o meu artigo "Livro didático e propaganda política", em que ataco duramente o "Projeto Araribá, Ensino fundamental, História 8", afirmando que o livro tem todas as falhas do "Nova História Crítica" e mais uma: faz propaganda político-eleitoral do PT. Rui Falcão publicou o artigo dele um dia depois, o que torna a coisa mais ridícula. Por que ridícula? Porque o livro que critiquei pertence à Editora Moderna, do grupo Santillana, a quem me acusaram de proteger.A discussão não teve apenas bizarrices; houve também má-fé. Luis Nassif escreveu artigo, publicado em seu blog e no "Diário do Grande ABC", insinuando que eu fizera mesmo lobby para a empresa espanhola. Dava como "prova" uma sociedade entre a Editora Globo e a Santillana, numa terceira empresa, a Editora Uno. Uma mentira deslavada. A revista "Época", da Editora Globo, apenas encomendou, como cliente, à Uno, dois projetos - o "Guia Vestibular 2008" e o "Guia Época Enem 2007", ambos para serem encartados exclusivamente como fascículos. Confundir cliente com sócio não é erro, é má-fé. Com um detalhe sórdido: para dar mais credibilidade à sua denúncia, Nassif omitiu que eu escrevera um artigo atacando o livro da editora espanhola.Escrevi uma resposta ao "Diário do Grande ABC", denunciando que Nassif mentira. Como resposta, Nassif publicou em seu blog a minha carta ao jornal paulista. Ao final dela, admitiu que fora "induzido ao erro", sem, porém, dizer por que ou por quem. Não pediu desculpas, nem a mim nem aos leitores dele, por fazer denúncia sem apuração. E em vez de dizer que a Editora Globo foi apenas cliente da Uno, preferiu usar o termo "parceira", no caso, de todo inadequado. Pior, não explicou aos leitores dele a omissão quanto ao meu artigo criticando o livro da Moderna e acrescentou alguns impropérios a mais contra mim. Imediatamente, escrevi uma tréplica, desmontando peça por peça o que Nassif dissera. À toa. Alegando falta de espaço, ele nada publicou, ignorando que o espaço na internet é infinito. Preferiu manter comigo uma longa troca de e-mails, em que ficou claro, para mim, que ele prefere conjecturas fantasiosas (e caluniosas) a fatos.Eu não chamo isso de jornalismo.


(*)
Jornalista, in O Globo

(IPAE -195-11/07)

Como mudar a educação com o uso de tecnologias


Paulo Nathanael Pereira de Souza(*)

1- Diagnóstico sumário da educação brasileira, como condição para o desenvolvimento.

Tornou-se lugar comum, nos dias atuais, afirmar que a educação é o mais importante insumo no desenvolvimento das nações. Isto porque, sem ela, o progresso faz-se impossível, tendo em vista o grau de participação da ciência e da tecnologia na estrutura e no funcionamento da sociedade moderna. Vive-se a era da informação, e quem não possuir um mínimo de formação geral, que já não se confunde apenas com a arte de ler, escrever e contar, mas impõe um saber maior que envolve conhecimentos outros, como: alguma familiaridade com uma língua estrangeira e o domínio básico do uso do computador, não terá lugar ao sol na disputa por trabalho e realização pessoal. Bacon, o grande filósofo inglês do século XVI, foi um profeta ao enfatizar nos seus escritos que saber é poder. Se vivesse, hoje, poderia ser havido como um ícone dos novos tempos.
A análise das razões do sucesso dos países chamados afluentes, neste início do século XXI, a saber: China, Índia, Coréia, Chile, para só citar os principais, leva sempre à certeza de que, onde a educação do povo foi levada a sério, o desenvolvimento acelerou-se. Zerar o analfabetismo e garantir matrícula para 90% das crianças de zero a seis anos na educação infantil, além de 100% para as de sete a quatorze anos e cerca de 90% no ensino médio às que concluem o fundamental, mais cerca de 10% dos que se formam no ensino médio e buscam o ensino superior, bem como assegurar a todos esses níveis e tipos de escolaridade e necessária qualidade acadêmica. Essa seria a fórmula ideal de uma educação voltada para a prosperidade de uma nação. Pelo menos foi isso o que efetivamente ocorreu na Coréia, considerada o grande exemplo a ser seguido, modernamente, pelos candidatos ao sucesso internacional. E o Brasil, como fica em todo esse mosaico de países, que lutam para sair do atraso econômico-social em que vivem desde há muito? O Brasil face aos problemas de sua educação não vai bem.
Todas as avaliações, de aprendizagem feitas internamente pelo MEC, ou externamente pela UNESCO, têm demonstrado um resultado pouco satisfatório no aproveitamento escolar da infância e da juventude. Conforme se lê nos relatórios referentes ao setor, só há um sucesso a comemorar entre nós: é o atingimento de 97% de matrículas no ensino fundamental para as crianças com sete anos de idade. Trata-se de uma vitória quantitativa, importante, mas insuficiente, eis que o nível de qualidade desse, e dos demais graus e tipos de ensino, continua a flutuar entre o ruim e o péssimo. Para se ter idéia da precariedade instalada, em nível nacional basta dizer que o estudante brasileiro que chega ao último ano do ensino médio, isto é, com dez anos de escolaridade, não sabe calcular médias aritméticas, resolver problemas que envolvam porcentagens, nem lidar com juros simples. Também é incapaz, ao ler um texto, de compreender a relação entre uma tese e os argumentos que a sustentam. Não é à toa que o país tem obtido o último lugar no elenco do PISA, avaliação executada pela OCDE e destinada a aferir a capacidade de leitura dos alunos. Esse quadro desolador em relação ao aproveitamento escolar agrega outros fatores negativos, como: alta repetência e uma taxa absurda de evasão em todas as séries do ensino básico que chega no ensino fundamental, a atingir 40%, da 1ª para a 2ª série. Ademais, observa-se um reflexo patológico desse estado de cousas no ensino superior: a minoria que nele se matricula (cerca de 4% dos formados no ensino médio), apresenta um tal montante de desaproveitamento escolar, que a universidade se viu obrigada, ultimamente, a funcionar no mais baixo nível de aprendizagem, que se possa imaginar. Haja vista o que se passa no exame de Ordem da OAB. Pouco se deve esperar de um ensino que, não tendo clientes capazes de aproveitá-lo, na inteireza da complexidade de estudos permeados pela ciência e a alta tecnologia, rebaixa suas exigências, e deixa de cumprir sua missão fundamental, que é a de criar uma elite intelectual capaz de colocar o país na vanguarda das exigências da era do conhecimento. A crise universitária aí está, não apenas com as suas penúrias próprias, mas principalmente com as que vem herdando dos graus de ensino, que antecedem o superior. E de nada adianta formatarem reformas, fundamentadas menos na pedagogia e mais na ideologia, a pretexto de salvar a universidade brasileira, eis que sua salvação só terá sentido depois de salvos os ensinos fundamental e médio, que, hoje, formam a base podre dos seus alicerces.

       2- O que pode a tecnologia educacional fazer para mudar a educação brasileira?

Na intersecção entre a comunicação e a educação, ao longo de todo o século XX, surgiram tais e tantas inovações tecnológicas, a partir do rádio, da televisão e do cinema, até os computadores e os satélites de transmissão, que é de admirar não tenha havido, ainda, com base nelas, uma ampla e profunda revolução em toda a educação mundial. Se no planeta, como um todo, mesmo nos países de ponta, o uso dessa tecnologia em favor da qualidade e da modernização do ensino, tem sido modesto e insuficiente, o que dizer do Brasil, onde, ainda, se ouvem das autoridades, restrições absurdas a projetos, como os de ensino a distância ou de inclusão da Internet aos usos e costumes escolares? Esses palpiteiros de gabinete, além de ignorarem o potencial de benefícios carreados pelas novas tecnologias, ainda ficam naquelas afirmações tolas e insustentáveis de que a educação presencial seria sempre mais séria e eficaz, do que as demais oriundas dos avanços tecnológicos. A legislação relativa ao uso do computador e outros mecanismos, na educação editada pelos dirigentes dos sistemas de ensino se faz sempre com o fim mais de barrar, do que de incrementar a inserção da escola nos progressos da tecnologia.
Torne-se, o caso da EAD. Para usá-la, a lei exige que a escola se credencie no MEC e que os programas se aprovem nos Conselhos de Educação. Como nesses órgãos escasseiam os especialistas nos novos conhecimentos, fazem-se normas, que refletem a importância geral, sobre o tema eis que só cuidam de medidas de segurança, quanto à qualidade do ensino as quais, na verdade, acabam por não assegurar coisa alguma. Algo que espanta nessas normas é a insistência com que se fala na EAD, como se se tratasse de uma modalidade de ensino, com epistemologia e fins próprios, como se fora ela mesma também um tipo de ensino. Uma lástima, que evidencia a profunda incultura dos responsáveis pelo assunto, eis que a EAD, como qualquer outra forma de didática voltada para o ato de educar, não se contrapõe à educação presencial. É apenas uma nova linguagem pedagógica, que combina a ação preparatória e supervisionadora dos professores, com o uso do instrumental eletrônico (ou até mesmo outros, menos sofisticados, como a correspondência, por exemplo) à disposição dos alunos para obviar resultados melhores na aprendizagem. Tanto faz, do ponto de vista dos resultados, que essa aprendizagem se faça presencialmente, por EAD, ou por processos combinados de uso de ambos. O essencial é que haja aprendizagem eficaz.
Com tanto preconceito e tanto desconhecimento interferindo nas decisões sobre o papel da tecnologia educacional nos processos educativos, não admira o fato de assistirmos penalizados à consolidação do atraso nas redes escolares do país. Muito da incapacidade de aprendizagem dos alunos – sua reprovação e evasão – nasce do desinteresse, do tédio e desse gap, que se alarga sempre, entre a tecnologia da informação e os bla-bla-blas diários das salas de aula. O aluno costuma estar, em matéria de informação, muito à frente de seus professores, o que explica, em parte, o desajuste entre as lições da escola e a aprendizagem informal, via Internet, que os jovens acabam obtendo, seja nos seus próprios computadores, seja naqueles que se alugam no cyber-café ou nas lan-houses da vida.
Como escrevemos, certa vez, em artigo publicado pela revista “Agitação (Ano XI, nº 60)”: no Brasil convivem três tipos de analfabetismo – o puro, que reúne milhões de adultos, que nunca passaram pela escola; o funcional, que reúne outros milhões, que passam pela escola e pouco ou quase nada aprendem; e o tecnológico, que atinge principalmente os professores, que ainda não descobriram os computadores, e estão perdendo a autoridade didática perante seus alunos. Assim, parodiando Castro Alves, que dizia ser importante semear livros à mancheiras, mister se faz agora distribuir milhões de computadores a mestres e alunos, para que se comece a fazer a grande revolução digital exigida da educação pela era do conhecimento.
O saneamento da educação brasileira e o início de sua qualificação só se fará com uma corajosa reforma global dos sistemas de ensino, pela qual, entre outros procedimentos se assegure a inclusão ampla, radical e funcional da tecnologia, com todas as suas mais recentes conquistas, à didática nossa de cada dia. Sem isso, os defeitos de aprendizagem continuarão a crescer nas estatísticas escolares e o Brasil poderá perder a corrida dos países emergentes no rumo da modernidade e do desenvolvimento.

(*)Ex-Presidente do Conselho Federal de Educação e Presidente do Conselho do CIEE

(IPAE -196-11/07)

A hora da união

Paulo Alcantara(*)

"A melhor coisa que os governos podem fazer para incentivar a inovação é sair do caminho". Esta recente afirmativa do The Economist reflete o pensamento de algumas das correntes mais expressivas na União Européia sobre os rumos da inovação. Felizmente, ela não se aplica ao nosso país, onde já há vários governos, ciência e tecnologia vêm sendo entendidas como uma questão de Estado, que se sobrepõe aos interesses políticos partidários. A criação dos fundos setoriais em 1999, seguida da aprovação da Lei da Inovação, em 2004, da Lei da Micro e da Pequena Empresa, já no final de 2006, e a criação da "subvenção econômica" para empresas que buscam a inovação demonstram o quanto o assunto se integra a agenda econômica governamental.A ação efetiva do Ministério da Ciência e da Tecnologia vem permitindo a geração de uma "cultura da inovação", indispensável para o incremento da competitividade nas empresas. O número de patentes, embora ainda muito abaixo de nossas potencialidades, triplicou na ultima década. As incubadoras e os parques tecnológicos têm crescido de forma expressiva. Ao mesmo tempo, o Programa de Aceleração do Crescimento em Ciência e Tecnologia, recentemente lançado, constituir-se-á em notável instrumento para o incremento da competitividade nas empresas e para o fortalecimento das relações universidade-empresa. Os reflexos sobre os governos estaduais já se fazem notar: o Rio de Janeiro acaba de lançar sua própria Lei da Micro Empresa, gerando novos estímulos para o desenvolvimento.Todavia, de forma surpreendente, continuamos patinando no cenário internacional da inovação.Onde estará o gargalo? Os indicadores do Ministério da Ciência e da Tecnologia e os fatos mostram que não estamos conseguindo responder às necessidades de formação de pessoal nos setores de engenharia e de tecnologia - que, nos últimos 10 anos, representam somente 11% dos doutores diplomados. A situação se agrava quando são analisados os dados da formação de engenheiros, técnicos e tecnólogos. A instalação de novos empreendimentos energéticos e siderúrgicos no Rio de Janeiro forçou as empresas responsáveis à "importação" de pessoal qualificado.Assim, torna-se imperioso adotar políticas de formação que sejam indutoras de uma reorientação da atuação das instituições de ensino superior, tornando-as capazes de compatibilizar a oferta de cursos com as necessidades dos arranjos produtivos, viabilizando a instalação de cadeias produtivas e de fornecedores capacitadas para responder com agilidade a estas demandas.A união entre o público e o privado será fundamental para o nosso êxito.Hoje é evidente o esforço do governo em expandir a atuação das universidades públicas, possibilitando uma distribuição mais equilibrada entre público e privado. Entretanto, não se pode esquecer que o Brasil conta com um pujante sistema de educação privada, representado por cerca de 2 mil instituições particulares, confessionais e comunitárias, instaladas em todas as regiões. A relevância social dessas instituições já foi demonstrada pela sua participação no ProUni, concedendo bolsas a centenas de milhares de estudantes que não têm acesso ao ensino gratuito oferecido pelas instituições publicas.Sua importância para o desenvolvimento poderá agora ser testemunhada se as engajarmos em programas de formação e de capacitação de técnicos e tecnólogos e engenheiros, sempre em conformidade com dimensões e peculiaridades de cada uma e ainda com as respectivas inserções locais.Numa época em que tanto se fala de compra e venda de instituições universitárias, oferecer a elas a alternativa do crescimento pela participação direta no nosso desenvolvimento será decisivo para que a rede de ensino superior brasileira abandone a trágica dicotomia público-privado e passe a ser reconhecida como o principal ator da construção do país.

(*)Reitor da Universidade Castelo Branco e Presidente da Rede de Tecnologia do Rio

(IPAE -197-11/07)

Crematório de cérebros

Cristovam Buarque(*)


É comum o horror diante da brutalidade de dirigentes que queimam livros e prendem ou matam intelectuais como o imperador chinês Shih Huang Ti, que, 210 anos antes de Cristo, decidiu queimar todos os livros e matar todos os estudiosos do seu império. Até hoje, a Inquisição horroriza o imaginário da humanidade pelo crime de destruir livros e matar intelectuais durante a Idade Média. Em Berlim, no campus da universidade Humboldt, há um local de reverência indignada no lugar onde Hitler queimou milhares de livros.
Mas não nos horrorizamos quando os livros são impedidos de ser escritos e os jovens de se transformarem em escritores. Indignamo-nos com a queima de livros e a prisão de escritores, mas não com a incineração de cérebros como se faz no Brasil, ao negarmos educação ao povo. Pior do que queimadores de livros, somos incineradores de cérebros que escreveriam livros, se tivessem a chance de estudar. A história do Brasil é a história do impedimento de que livros sejam escritos e de que cientistas e intelectuais floresçam.
Quando os livros são queimados, alguns se salvam. Mas se eles não são escritos, não há o que salvar. Quando os escritores se salvam, eles escrevem outros livros, mas quando não aprendem a ler, queimam-se todos os livros que poderia escrever.
O Brasil é um crematório de cérebros.
Ao nascer, cada ser humano traz o imenso potencial de um cérebro vivo e virgem. Como um poço de energia a ser ainda construído: pela educação. No Brasil, treze porcento dos adultos são analfabetos, apenas trinta e cinco porcento concluem o ensino médio; destes, só a metade tem uma educação básica com qualidade acima da média. Portanto, oitenta e dois porcento ficam impedidos de escrever, todos os livros que escreveriam são queimados antes de escritos. Como se o Brasil fosse um imenso crematório de inteligência.
As conseqüências são perfeitamente perceptíveis: basta olhar a cara da escola pública no presente para ver a cara do País no futuro. Apesar de nossos quase 200 milhões de cérebros, o quinto maior potencial intelectual do mundo, o Brasil continuará a ser um país periférico na produção de conhecimento. Da mesma forma como a China regrediu intelectualmente depois de Shih Huang Ti; a Alemanha, com Hitler; a Península Ibérica, com a Inquisição; o Brasil está perdendo o potencial de seus cérebros interrompidos. O resultado já é visível: ineficiência, atraso, violência, desemprego, desigualdade, tolerância com a corrupção e a contravenção. Um país dividido por um muro da desigualdade que separa pobres e ricos; e separado das nações desenvolvidas.
Durante anos, falou-se no "decolar" da economia. Achava-se que para um país ter futuro bastava educar uma elite, um pequeno conjunto de profissionais superiores a serviço da economia. Formamos uma minoria no ensino superior, escolhida depois de rejeitar a imensa maioria na educação de base, e perdermos o potencial das dezenas de milhões deixadas para trás.
Ou o Brasil se educa ou fracassa; ou educamos todos ou não teremos futuro e a desigualdade continuará; ou desenvolvemos um potencial científico-tecnológico, ou ficamos para trás. Se a universidade é a fábrica do futuro, o ensino fundamental é a fábrica da universidade. Sem uma professora primária que lhe tivesse ensinado as primeiras letras e as quatro operações, Albert Einstein não teria se tornado cientista. Nossos prêmios Nobel morreram antes de aprender as quatro operações. Não podemos formar inteligências enquanto formos queimadores de cérebros. Não podemos melhorar a educação superior sem uma educação realmente universal e de qualidade para todos.
Só o pleno desenvolvimento do imenso potencial da energia intelectual dos brasileiros permitirá derrubar o muro do atraso e o muro da desigualdade. Mas isso exige que o horror que sentimos com os estrangeiros que queimavam livros e sábios, seja transferido para nós próprios, incineradores de livros que não foram escritos, de doutores que morreram analfabetos. Incineradores de cérebros.

                                                                  (*)Senador da República, in O Globo
                                                                                          
                                                                                               
(IPAE
-198-11/07)


The brazilian journal of qualquer coisa...


Ubiratan Iorio(*)

Certos órgãos públicos serviriam muito melhor ao público se, simplesmente, fossem extintos! A Lei n.º 11.502, de 11 de julho de 2007, modifica as competências e a estrutura organizacional da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação. Para o ministro da área, o instrumento legal cria uma "nova Capes", que subsidiará o MEC "na formulação de políticas e no desenvolvimento de atividades de suporte à formação de profissionais de magistério para a educação básica e superior e para o desenvolvimento científico e tecnológico do país".
O que Sua Excelência omite é que, para exercer as "novas" funções, que conferem ainda mais poder aos burocratas, a "nova" Capes recebe de presente, na bandeja das nomeações, mais 410 cargos de assistentes e analistas em Ciência e Tecnologia, além de 52 cargos adicionais em comissão (DAS), que não exigem concurso para preenchimento.
É o estilo PT de gerir, segundo o qual "mais sempre é preferível a menos, quando se trata de preencher cargos públicos com companheiros", não importando o bolso do contribuinte nem preceitos morais e éticos. Segundo apregoam, a presente inchação destina-se a "induzir e fomentar a formação inicial e continuada de profissionais de magistério".
Ora, a própria Secretaria de Educação Superior do MEC, responsável pela regulação, supervisão e avaliação das 2.460 IES do sistema, com mais de 4,5 milhões de alunos, dispõe de apenas 72 DAS e nenhum assistente ou analista com formação específica para a supervisão do ensino de graduação. Portanto, é injustificável que a Capes, que supervisiona 2.452 programas de mestrado e doutorado, com cerca de 130 mil alunos, mesmo com a ampliação absurda de suas funções, infle mais ainda sua estrutura.
O Brasil ocupa desonroso lugar nos índices de realização tecnológica computados pela ONU, atrás de países que, em termos de capacidade instalada para a produção científico-tecnológica, são claramente inferiores. A má colocação brasileira reflete diversos vícios, como a falta de integração dos órgãos de fomento à pesquisa, a ineficácia dos incentivos à pesquisa e desenvolvimento, o baixo investimento nas áreas de inovação e, obviamente, a própria Capes - por si só, um hino aos controles burocráticos e ao desperdício.
Nessa débâcle, a fundação responsável por mais da metade das bolsas de pós-graduação no país e pela avaliação da pós-graduação stricto sensu, vem servindo mais, na esbórnia a que se dá o nome de "governo do PT", como um instrumento de aprofundamento de nosso vergonhoso atraso.
A política que aplica nas avaliações dos cursos é centralizadora, ultrapassada, ineficaz, mecânica e desprovida de inteligência e induz os pesquisadores de nossas universidades a preocuparem-se mais em publicar seus artigos "acadêmicos" - que nem sempre são de fato acadêmicos - para que a sua instituição alcance uma boa nota na avaliação trienal, do que em produzir ciência e tecnologia com resultados positivos para o país.
É um erro crasso prestigiar mais os papers acadêmicos - que, muitas vezes, são publicados em revistas científicas irrelevantes - do que pesquisas que possam resultar em inovações tecnológicas, patentes industriais e geração de riqueza material e intelectual para o Brasil. É a política do paper acadêmico pelo paper acadêmico, sem qualquer preocupação quanto à eficácia dos resultados, em que o artigo publicado não é mera conseqüência, mas o fim próprio da pesquisa: não é o cavalo que sacode o rabo, mas o rabo que balança o cavalo... O objetivo, adulterado, passa a ser o de publicar a qualquer custo, inclusive ao imenso custo do esbanjamento de recursos escassos, em um país pobre.

(*)Economista, in Estado de São Paulo

(IPAE -199-11/07)

Ser professor: paixão ou adicção?

Maria Clara Bingemer(*)


Ninguém tem algo por que viver se não tem ao mesmo tempo algo por que morrer. O ser humano tem necessidade de apaixonar-se, canalizar com todas as forças seus desejos, energias, impulsos vitais e recursos internos e externos em direção a um objetivo no qual acredita apaixonadamente. E a ele dedicar-se com tudo que é e possui. Com intensa paixão.
Parece-me que um dos problemas de nossa cultura hoje é que há pouca paixão. As pessoas não enxergam mais razões e causas pelas quais entregar-se, pelas quais dar a vida. E assim não encontram igualmente motivações para viver intensamente. Em lugar da paixão encontram a adicção. Pois onde não há paixão, há adicção.
Nossas fomes viscerais, os desejos que nos devoram as entranhas, não encontram caudais suficientemente volumosos para jorrar. E então se atrofiam, permanecendo reféns de uma triste mediocridade. Ou se agarram fanaticamente a ídolos, marcas, logos, objetos de consumo que lhes acalmam momentânea e passageiramente o desejo para depois fazê-los ressurgir mais ferozes que nunca, esporeados pela frustração e o desalento. Surge então a adicção que mina as forças e encolhe a cabeça. E, pior que tudo, anestesia a paixão.
Estranha reflexão para celebrar o Dia do Professor? Não creio, já que estou convencida, após 25 anos neste labor diuturno, cansativo e fascinante, de que educar é questão de paixão. Se não há paixão, não há empenho nem compromisso possível com a sala de aula. O diálogo com os alunos e o trabalho incessante de rasgar horizontes e abrir fronteiras afiguram-se como tarefa monótona e infrutífera. O desalento ronda como dragão e quando menos se espera deu o golpe mortal sobre a paixão.
Se isso é verdade universal, quanto mais no Brasil de hoje, onde a educação se encontra cada vez mais humilhada, desatendida e espezinhada. As prioridades nacionais apontam muito mais na direção da adicção: as oscilações do dólar, a inflação que sobe ou baixa, os escândalos do Senado, a capa da Playboy. E as inexplicáveis, ocas e repugnantes cenas do Big brother ou equivalentes.
Enquanto isso, as escolas caem aos pedaços, desmanteladas e em ruínas. Os professores devem dar aulas em cinco ou seis lugares diferentes para poder sobreviver, e isso significa que não darão em lugar nenhum aula digna desse nome. E abandonarão o magistério para dedicar-se a tarefa mais rentável, que pode ser trabalhar em loja, dirigir um táxi ou virar sacoleiro, vendendo bijuterias e roupas íntimas em casas e escritórios vários.
Porém, graças a Deus existem os apaixonados. Os que acreditam e amam. E porque amam com paixão apostam que o ser humano tem potencial criador e foi feito para voar alto. Por isso usam como instrumento de trabalho a garganta, o giz e o quadro-negro. Escrevem textos e preparam apostilas. Emprestam livros para os alunos que não têm dinheiro para comprá-los. Permanecem depois do horário das aulas conversando com os jovens sedentos de prosseguir o diálogo que lhes abre novos mundos com os quais sonhar e nos quais viver.
Onde não houver adicção, haverá paixão. Onde o melhor que há nos seres humanos não estiver totalmente anestesiado, ali estará um professor. E um aluno. E ali germinará entre ambos um processo educativo que encontrará sua fonte na paixão pela vida, na fé que responde ao desvelamento dos mistérios do conhecimento com reverência e zelo.
Por isso, penso emocionada em todos os professores que marcaram minha vida e me fizeram acreditar na educação como caminho e estilo de vida. Em todos os colegas que ao longo de 25 anos me ensinaram e ensinam a beleza de compartilhar uma paixão. Em todos os alunos que, entra ano, sai ano, me revelam quem sou: professora apaixonada pelo que faz e desejosa de fazê-lo sempre melhor. Feliz Dia do Professor a todos e a todas! Sigamos apaixonados! Apesar de tudo, vale a pena.

  (*)Teóloga e professora da PUC, in Jornal do Brasil

(IPAE -
200-11/07)

Educação em Foco

Na presente edição destacamos os fatos que foram notícias nos meses de setembro e outubro de 2007.

Setembro

O mês de setembro de 2007 foi marcado por uma série de eventos educacionais no Brasil, iniciando uma série de debates e estudos comparativos com trabalhos realizados em outras nações.
Dentre eles destacaram-se o 13º Congresso Internacional de Educação a Distância, promovido pela ABED - Associação Brasileira de Educação a Distância, na cidade de Curitiba e o V Congresso Internacional de Educação Infantil, cuja iniciativa foi da Associação Brasileira de Educação Infantil (ASBREI), tendo as atividades sido feitas no Rio de Janeiro. Ambos mostraram, sob ângulos diferentes, a importância de novas formas de pensar e fazer.
Também mereceu destaque o término do Ciclo de Debates sobre Idéias para a Modernização da Educação no Brasil, organizado pela Comissão de Educação do Senado Federal. Ao todo foram doze audiências públicas das quais participaram as mais expressivas personalidades educacionais brasileiras. O documento final trará propostas para que existam políticas públicas voltadas para o setor.
No âmbito do ensino superior o destaque foi o Congresso Internacional de reitores Latino-Americanos e Caribenhos, realizado em Belo Horizonte. O principal tema foi a Universidade do Século XXI e foram incentivadas parcerias entre as instituições do continente.
A UNESCO organizou, em São Paulo, em conjunto com o Parlamento Latino-americano, a Conferência Interparlamentar da América Latina e Caribe. Representações de mais de vinte países estiveram presentes buscando um maior relacionamento entre os povos da região.
Dentro desse contexto o governo brasileiro anunciou maiores recursos para a área de Ciência e Tecnologia. Segundo dados do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico mais de R$ 15 milhões serão alocados para projetos de pesquisa e inovação.
Durante setembro o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística divulgou a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio destacando que estamos melhorando - embora lentamente - nos níveis de qualidade da educação.
Ponto positivo é o crescimento da infra-estrutura para o maior uso de tecnologias educacionais. Ponto negativo é a manutenção de altos níveis de analfabetos plenos e funcionais.
Ainda no campo nacional tivemos a aprovação, pelo Conselho Nacional de Educação, da primeira transformação de Centro Universitário em Universidade. Esse posicionamento deverá abrir uma tendência de crescimento das universidades - especialmente as privadas - no Brasil.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional foi novamente modificada. Desta vez um projeto foi aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo Presidente da República definindo a obrigatoriedade de ensino dos direitos das crianças e adolescentes nas escolas de educação básica.
O Ministério da Educação, dentro do seu furor legislativo, editou novas portarias e homologou pareceres do CNE que fixam regras mais rígidas para implantação de instituições, cursos e polos de educação a distância. Novos instrumentos avaliativos dificultarão o funcionamento de cursos superiores, especialmente nas cidades de menor porte.
Uma pesquisa elaborada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e divulgada em setembro destacou que entre os 34 países estudados o Brasil é o investe menos por estudante do ensino básico. O valor apurado é de R$ 2.500,00. O Chile, por exemplo, aplica mais do dobro. Há uma grande desproporção com o que acontece no ensino superior, onde os gastos são de cerca de R$ 17.000,00.
Da Inglaterra vem a notícia de que os pais serão responsabilizados e punidos se deixarem de acompanhar os alunos em suas fases de suspensão por indisciplina. O governo pretende que exista um compartilhamento no cumprimento das penas entre escolas e família.
Assim foi setembro, prometendo uma série de novos debates brasileiros e mundiais nos próximos meses do ano.

Outubro

O mês de outubro de 2007 foi marcado pela realização de um significativo evento internacional na cidade do Rio de Janeiro que debateu o "Impacto das Tecnologias da Comunicação e da Informação na realidade educacional". Promovido pela Associação Brasileira de Tecnologia Educacional - ABT o 1º Congresso Internacional de Tecnologia Educacional congregou especialistas dos cinco continentes em torno do tema central.
Os resultados, bastante satisfatórios, mostraram que os programas de uso de tecnologias no sistema de aprendizagem vêm sendo bem absorvidos pelos alunos, embora tenha ainda muitas resistências por parte dos professores.
O documento final destaca caminhos que podem ser usados pelos formuladores de políticas públicas no Brasil e em nações em desenvolvimento.
Também nesse mês o professor é homenageado, com o dia mundial, a 5 de outubro e a 15, no Brasil. Poucas festas ocorreram, como no passado e sequer uma mensagem por parte do governo, foi emitida.
Aspectos positivos vieram da Semana de Ciência e Tecnologia que mostrou relevantes trabalhos feitos por instituições de ensino, entidades públicas e privadas e especialmente através de organizações da sociedade civil.
O tema "terra" permitiu reflexões sobre a preservação do nosso planeta e foram superadas as mais de oito mil atividades notadas no ano anterior.
Causou impacto a avaliação dos cursos de mestrado e doutorado. Um número significativo de programas possui nível de excelência internacional. Atualmente há 2.266 cursos de pós-graduação "stricto sensu" em funcionamento.
Novo estudo mostrou que há 2.457 instituições de ensino superior, onde funcionam 38.236 cursos de graduação, com forte predominância da rede privada que congrega 89,6% das casas de ensino.
Um relatório do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística afirmou que o Brasil tem a segunda maior taxa de analfabetismo na América Latina, só perdendo para a Bolívia.
No Índice Global de Talentos, elaborado por consultorias americanas e inglesas, o Brasil ficou em 23º lugares numa lista de 30 países. Uma das razões é a alta relação de alunos por mestres. Temos 22 estudantes por docente. Nos Estados Unidos da América e no Canadá é de 14 por um e na Itália, dez.
No âmbito internacional o maior encontro foi a 34ª Conferência Geral da UNESCO, em Paris, que definiu estratégias de ações para o período de 2008 a 2013.
Atualmente há 192 Estado-membros e diversas propostas aconteceram com vistas a se ter um maior progresso especialmente nas nações menos favorecidas.
A França anunciou o fim das aulas aos sábados nas escolas primárias a partir do próximo período letivo, no outono de 2008. As aulas a menos serão distribuídas pelos demais dias da semana. Nos finais de semana as escolas serão abertas às atividades culturais e esportivas.
A expansão do ensino do mandarim, idioma oficial chinês, vem sendo financiada pelo país oriental em outras nações. Numa delas (Inglaterra) os resultados tem sido bem recebido pelos alunos que vêm grandes tendências de crescimento das oportunidades com os efeitos da globalização.
A limitação do peso de mochilas escolares foi destaque na Itália. Segundo um projeto de lei já aprovado na Câmara dos Deputados e em apreciação no Senado, o material não deve pesar mais de 10 a 15% do corpo da criança.
Um guia sobre educação alimentar nas escolas foi lançado pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação). O mesmo é dirigido a professores, nutricionistas e profissionais da saúde. O objetivo é ensinar hábitos saudáveis às crianças para diminuir as doenças relacionadas à má nutrição.
Segundo os dados da instituição 1,6 bilhão de pessoas no mundo estão acima do peso e 400 milhões são obesas.
Outro estudo, feito pela UNESCO, mostra dados de 200 países acerca dos gastos em educação. O líder absoluto é os Estados Unidos da América que gasta 28% do total do universo. Bons números estão mostrados também na Alemanha, Itália, França, Israel e Cuba.
O continente europeu destacou o crescimento do ensino superior privado, através de um estudo lançado pela UNESCO. A mostra analisou treze países do Velho Mundo e representa uma tendência que deve ocorrer em outros continentes.
Por fim, a Arábia Saudita informa que está investindo US$ 12,5 bilhões para construir um centro acadêmico de ensino superior e pesquisas. A futura instituição terá orçamento de cerca de 10 bilhões de dólares.
O principal objetivo é reduzir a defasagem tecnológica que existe em relação ao Ocidente. O corpo docente será constituído por renomados especialistas internacionais, selecionados nos países de maior avanço educacional.
Assim foi o décimo mês do ano que mostrou esforços comuns para que exista a melhoria da qualidade da educação no mundo.

(IPAE-201-11/07)

 


Atualidades em Educação

  • Publicação do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação registrada no Cartório do registro Civil das Pessoas Jurídicas do Rio de Janeiro sob o nº 3071, Livro A 04, em 10 de outubro de 1989
  • Exemplares arquivados na Biblioteca Nacional de acordo com Lei nº 10.944, de 14 de dezembro de 2004 (Lei do Depósito Legal).
  • ISSN (International Standard Serial Number) nº 0103-071X conforme registro no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia - IBICT (Centro Brasileiro do ISSN), vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia.
  • Editora do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação cadastrada no ISBN (International Standard Book Number) sob o nº 85927 conforme registro na Biblioteca Nacional.

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FICHA CATALOGRÁFICA

Atualidades em  Educação
- Nº 1 (jul. 1983). - Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação, 1995 - N.1 ; 29.5 cm - Bimestral
Publicação do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação.
1. Educação - periódico I . Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação. CDU37.312(05)