ano 18 - nº 102 - fevereiro de 2009
A
imprescindivel necessidade de alteração da legislação que fixa o valor das
anuidades escolares nas escolas particulares
João
Roberto Moreira Alves (*)
O Artigo 209
da Constituição Federal afirma que "O ensino é livre à iniciativa privada,
atendidas as seguintes condições: I - cumprimento das normas gerais da
educação e II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público".
Não obstante a essa liberdade, já assegurada em Cartas anteriores, o Poder
Público vem, há várias décadas, intervindo nos preços cobrados pelas
entidades mantenedoras de escolas de educação básica e superior.
O marco
referencial da legislação brasileira é o Decreto-Lei nº 3.200, de 19 de
abril de 1941, que definia normas sobre a "Organização e Proteção da
Família". Em seu Artigo 24 determinava a garantia de descontos progressivos
por filho matriculado na mesma escola, entre 20 e 60% do valor cobrado.
Coube à
Consultoria Geral da República, em 1983, elaborar um Parecer (aprovado pelo
então Presidente da República), afirmando que o dispositivo não mais
vigorava, tendo em vista incompatibilidade com princípios constitucionais.
Novos instrumentos foram sendo baixados ao longo do tempo, como o
Decreto-Lei nº 4.750, de 28 de setembro de 1942, que dava poderes ao
Coordenador de Mobilização Econômica do Governo Federal para fixar os
limites de preços pelos quais as mercadorias ou materiais deveriam ser
vendidos ou os preços deviam ser pagos. Atingia, de forma direta, as escolas
particulares.
As chamadas "Leis Orgânicas do Ensino" dentre elas o Decreto-Lei nº 4.244,
de 9 de abril de 1942, que disciplinava o ensino secundário, davam poderes
ao Ministro da Educação para fixar normas sobre as contribuições exigidas
dos alunos.
Adveio então, vinte e oito anos após a primeira disposição, o Decreto-Lei nº
532, de 16 de abril de 1969, dispondo sobre a fixação e reajustamento de
anuidades, taxas e demais contribuições do serviço educacional.. Dizia o ato
legislativo que os preços deveriam ser fixados pelos colégios tendo por base
o princípio da compatibilização entre a evolução dos preços e a
correspondente variação de custos.
A partir de 1986, com a edição da política de congelamento de preços, vieram
sucessivos decretos e portarias modificando a sistemática em vigor.
Com a nova Constituição, dois anos mais tarde, as Medidas Provisórias
passaram a ser editadas e, a MP 176, de 29 de março de 1990 (mais tarde
transformada na Lei nº 8.039, de 30 de maio do mesmo ano) redefiniu
critérios.
Outras MPs chegaram a envolver a matéria e o Congresso Nacional aprovou a
Lei nº 8.170, de 19 de janeiro de 1991, pouco depois modificada pela Lei nº
8.178 (de 4 de março do mesmo ano), com outras regras.
Novas Medidas Provisória criaram outros critérios e, finalmente, o
Legislativo edita a Lei nº 9.870, de 23 de novembro de 1999, passando a ter
plena eficácia.
A solução encontrada pelo Legislativo, em conjunto com o Executivo e as
entidades representativas de alunos e estabelecimentos de ensino,
contemplava todos os pontos e permitia, em especial, que os alunos pudessem
estudar normalmente sem aplicação de penalidades, desde que o atraso não
fosse superior a noventa dias.
Numa atitude surpreendente o Executivo, seis dias após a edição da lei,
baixou a Medida Provisória nº 1.930, de 29 de novembro de 1999, alterando os
critérios e proibindo que as mantenedoras aplicassem qualquer penalidade aos
alunos inadimplentes.
Estabeleceu-se o chamado "calote institucionalizado" que, infelizmente,
perdura até hoje.
A MP não foi votada e pela sistemática vigente à época era preciso
reeditá-la para evitar perda da validade.
Seguiram-se, então 23 reedições, sendo que a última (ainda hoje vigente) tem
o número 2.173-24, sendo datada de 23 de agosto de 2001.
O Congresso Nacional não vota a matéria, não obstante existir aprovado pela
então Comissão Mista (envolvendo Senadores e Deputados) o Projeto de
Conversão nº 8, de 2001, pronto para entrada na ordem do dia.
Ressaltamos
que trata-se de MP anterior à vigência da Emenda Constitucional nº 32,
inexistindo, portanto, a necessidade de votação separadamente nas Casas
Legislativas. O Presidente do Congresso pode colocá-la em pauta na Ordem do
Dia conforme sua disposição pessoal.
Objetivando solucionar a matéria existem duas alternativas:
a) a
primeira, mais prática e que depende apenas do Executivo, será a retirada da
MP editada pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso. Com isso
restabelece-se em sua plenitude, a Lei 9.870, de 23 de novembro de 1999;
b) a outra é
a votação da MP e sua transformação em lei. O substitutivo contempla
parcialmente a matéria.
Vale
registro que ao longo do tempo as escolas foram obrigadas a cumprir 130 atos
legislativos federais (entre decretos-lei, leis e medidas provisórias), além
de dezenas de decretos, portarias e disposições infralegais.
Nesse conjunto de normas estabeleceu-se o princípio do "calote" e uma grave
consequencia nas entidades mantenedoras de escolas privadas de todos os
níveis e modalidades. Muitas delas acumulam passivos significativos que
dificilmente serão quitados, se persistir o quadro legal em vigor no Brasil.
As propostas
supramencionadas são tecnicamente possíveis, cabendo a decisão quanto à
forma, às lideranças políticas de nosso país.
(*)
Presidente do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação
(IPAE 147 - 02/09)
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